InícioAMAZONAS*Recortes da Cultura Norte Amazônida* *NOVOS BUMBÁS* Por Basílio Tenório

*Recortes da Cultura Norte Amazônida* *NOVOS BUMBÁS* Por Basílio Tenório

Os seguidores do FOCO AMAZÔNICO devem ter observado que o Boi bumbá Caprichoso ainda não foi citado em “Recortes da Cultura Norte Amazônida” e com justa razão devam ter perguntado: “Porquê”?. Ocorre que no tempo histórico que ora trabalho o referido bumbá ainda não existia. Segundo a cronologia das evidencias históricas o primeiro bumbá que existiu em Parintins foi o Boi Malhadinho, fundado pelo Professor Rufino Souza e porque se apresentava no terreiro da Escola onde ele lecionava, na propriedade denominada Terra Santa, entrou para a História como: Boi Malhadinho de Terra Santa. O segundo foi o Boi Garantido, fundado por Antônio Lindolfo Marinho da Silva que, anos depois, por força da sua poesia entraria para a História assinando: Lindolfo Monteverde. O terceiro foi o Boi Galante fundado pelos parceiros Emídio Vieira e Thomás Velásquez. O quarto foi o Boi Desigual, fundado pela família Fernandes. O sexto foi o Boi Caprichoso fundado pelos irmãos: Pedro Cid, Nascimento Cid e Artur Cid, em outubro de 1926 e se apresentou pela primeira vez em junho de 1927.

​Seguindo a cronologia das evidencias históricas, em 1923, provocados pela poesia de Lindolfo Monteverde e seus pares pioneiros vinculados à poética vermelha e branca do Boi bumbá Garantido, Emídio Vieira e Thomás Velásquez fundaram o Boi Galante. Segundo consta, por falta de dinheiro para comprar o tecido aveludado na Loja R. B. BAPTISTA, Thomás Velásquez ofertou sua própria rede de dormir para ser o couro do referido bumbá. No mesmo ano a família Fernandes fundou o Boi Desigual. A diferença entre esses bumbás era que se o Boi Galante surgiu fadado a desfiar o Boi Garantido ao redor das fogueiras, o Boi Desigual simplesmente se apresentava pelas ruas de cidade; se o Boi Galante era um bumbá plebeu, o Boi Desigual era um bumbá de elite e seu próprio nome o dizia. No entanto, quando o Boi Galante conseguia convite para se apresentar no terreiro de “algum figurão” a família Fernandes emprestava o Boi Desigual a Emidio Vieira e a Thomás Velásquez para se apresentar como se fosse o Boi Galante.

A isso referente, onde hoje se ergue o Hospital Jofre Cohen era a Fazenda Paraízo, onde a rapaziada vinculada aos referidos bumbás trabalhavam. Ao longo do caminho até lá, exatamente onde hoje se ergue a residência episcopal havia um curral e porque o mês de junho se apresenta em tempo de cheia passando por lá, enquanto observavam o peão do coronel de beiradão ordenhando uma vaca, a rapaziada se deparou com dois touro brigando por causa de uma novilha no cio. Aquele visual os motivou a inventar a briga de touros e cuidaram dos detalhes para as apresentações.

Residência episcopal, em Parintins.
Fonte: Basílio Tenório.

Diferente do boi confeccionada para as danças típicas da referida forma de expressão, o boi de briga tinha que ser reforçado, grotesco. De igual modo, se o “tripa” do boi feito para danças era um home de porte pequeno ou médio, o “tripa” do boi de briga tinha que ser um caboclo “fortão, raçudo” que aguentasse “o tranco da porrada”. O tria do Garantido enquanto boi de briga era Gervásio Silva, irmão de Lindolfo Monteverde, “sujeito braçudo” que respondia pelo apelido de Baladeira”; o “tripa” do Galante enquanto boi de briga era Ramiro, “sujeito raçudo” quanto o Baladeira, que também atendia pelo apelido de “Ramiro vaca brava”. Fato é que ao redor da fogueira, caso o desafiante fosse o Boi Garantido, Mundico Cid alçava a voz e versejava:

Mandeu buscar boi de ferro
Pra brigar com boi de aço
Este ano eu quero ver
O qual vai voar aos pedaços.

Fonte: Dona Raimunda Silva.

Assim se iniciava a briga de touros e prosseguia motivada em versos e toadas providas de ambos grupos folclóricos. Enquanto isso os touros “se pegavam na porrada” e só paravam quando os amos autorizavam em respectivos versos. Vezes houve em que os bois “se espatifavam” e porque não podiam parar os “tripas” prosseguiam agora em eclético corpo a corpo e a “assistência” se esbaldava em risos e gargalhadas. Concluída a apresentação os “tripas” desciam para tomar banho de rio, feito isso se reintegravam aos respectivos conjuntos folclóricos. Foi justamente uma daquelas brigas de touro que provocou a fundação do Boi bumbá Caprichoso.
​Era o ano de 1926 e marcaram uma apresentação de briga de touros fronte a residencial do senhor “Malagueta”. Homem cuja riqueza era duvidosa, pois que não provinha da pecuária nem das fazendas de cacau, até porque não as possuía, no entanto respeitado na cidade e até pelo fato de haver doado os relógios que badalavam na torre da Igreja Matriz”, hoje do Sagrado Coração de Jesus. Para aquela apresentação o “tripa” Baladeira utilizando uma lima morsa paralela de 12” afiou os cornos do Boi Garantido deixando-os como duas navalhas afiadas, camuflou com papel crepom e guardou o segredo para si. Aconteceu que nos momentos daquela apresentação para o senhor Malagueta, que se esbaldava em gargalhadas, “em um rodopio estudado” o Boi Garantido desferiu uma chifrada de baixo para cima, “tão bem estudado” que degolou o Boi Galante. A cabeça do referido bumbá não caiu, mas ficou pendurada ao próprio pescoço.

Antiga igreja matriz, hoje do Sagrado Coração de Jesus, em Parintins, destacando os relógios doados pelo senhor Malagueta.
Fonte: Google, junho de 2025.

​Ante “aquilo” o conjunto folclórico do Boi Galante “partiu pra cima do Baladeira” decido a “encher a cara dele de porrada”, o conjunto folclórico do Boi Garantido saiu em sua defesa e foi pancadaria que virou a madrugada e só parou quando o dia já avermelhava no horizonte. Fato foi que aquele foi a primeira briga de rua entre grupos folclóricos na história da cultura do boi bumbá em Parintins e teve por consequência: i) pela primeira vez um policial militar de patente assumia a Delegacia de Polícia em Parintins; ii) provocou a fundação do Boi bumbá Caprichoso.

Por Basílio Tenório

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