Falha na bomba de vácuo, causada por óleo contaminado por detritos da correia, deixa donos de Onix, Tracker e Montana em situação de risco ao volante
Desde a introdução dos motores com correia banhada a óleo, surgiram incontáveis relatos de donos de Chevrolet Onix, Onix Plus, Tracker e Montana com problemas decorrentes desse sistema. Com suas vantagens e desvantagens, esse tipo de motor exige manutenção rigorosa e de acordo com as especificações oficiais de óleo lubrificante, se não oferece grande risco de problemas mecânicos.
Além da ruptura da correia, existem relatos do pedal de freio ficar repentinamente endurecido. Em alguns casos, o pedal se enrijece a ponto de quase não ser possível frear, o que gera grande preocupação entre motoristas e possíveis compradores desses modelos.
Embora grave, o problema tem origem técnica conhecida e está relacionado a uma falha da bomba de vácuo, componente vital para na assistência à frenagem, e que, por sua vez, está integrado ao sistema de lubrificação do motor. Ou seja, no caso dos Chevrolet nacionais com motor CSS Prime (1.0 aspirado, 1.0 turbo e 1.2 turbo de três cilindros), é o mesmo sistema também responsável por lubrificar a correia.
Segundo especialistas consultados por Autoesporte, a falha não vem de defeitos na bomba em si, mas é um efeito em cadeia causado por manutenção inadequada — especialmente com relação ao tipo de óleo usado no motor.
Bomba entope com detritos da correia e o freio endurece
Os carros da Chevrolet afetados utilizam motor com correia dentada banhada a óleo, solução cada vez mais comum entre fabricantes que buscam mais eficiência energética e menores índices de ruído e vibração. Diferente das correias dentadas tradicionais, que funcionam “a seco”, a correia banhada é constantemente lubrificada pelo óleo do próprio motor, assim como uma corrente de comando — e, por isso mesmo, depende da qualidade desse lubrificante.
“A especificação do óleo lubrificante e a frequência de substituição do óleo são muito importantes para garantir a vida da correia”, explica o professor Clayton Zabeu, do curso de Engenharia Mecânica do Instituto Mauá de Tecnologia. “Como agora o óleo está em contato direto com a correia, a qualidade e o estado do lubrificante terão impacto no desempenho desse elemento”, acrescenta.
Nelson Morales, coordenador de produto da Dayco, fabricante de correias sincronizadoras, complementa: “A correia banhada a óleo trabalha em contato contínuo com o lubrificante. Portanto, qualquer degradação ou contaminação no óleo pode acelerar o desgaste da correia, reduzindo sua durabilidade e comprometendo todo o sistema de sincronização”, ressalta.
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É aqui que o problema acontece: com o uso de um óleo fora das especificações recomendadas pela General Motors, a correia pode começar a se degradar antes do previsto. Fragmentos do material se soltam, circulam pelo sistema de lubrificação e acabam entupindo dutos como o canal que lubrifica a bomba de vácuo. Sem refrigeração, a bomba superaquece e deixa de funcionar, resultando na perda da assistência ao freio.
Casos reais de falha
Conversamos com duas pessoas que passaram por problema semelhante com seus carros da Chevrolet. O médico Rodrigo P. – pseudônimo usado a pedido da fonte, que não quis se identificar – passou por um susto com seu Chevrolet Onix Plus LT 2023:
“Minha esposa estava dirigindo o carro na cidade e, quando pisou no freio, sentiu o pedal muito duro e freando muito pouco. Ela usou o freio de mão para [controlar o veículo] e [conseguiu] voltar para casa [sem nenhum incidente]”, relata.
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Rodrigo havia comprado seu carro de uma loja multimarcas, já com 65 mil km, em 2024. Sem cobertura da garantia pelo antigo proprietário ter feito as revisões fora da rede, realizou o diagnóstico e reparo em uma oficina particular, que descreveu o problema de entupimento do duto de lubrificação que causou a quebra da bomba de vácuo.
Foi só então que o médico descobriu a questão do lubrificante e das certificações necessárias para a correia banhada a óleo. “Só depois do problema o mecânico me explicou sobre esse óleo específico e os cuidados desse modelo. Antes disso, não me atentei a esse ponto e deixava tudo aos cuidados da oficina em que fazia as revisões no meu carro”, comenta.
O custo do reparo para Rodrigo foi de R$ 1.120, contando R$ 800 da nova bomba e R$ 320 da mão-de-obra. Entretanto, o freio do Onix Plus voltou a falhar posteriormente e ele acabou se desfazendo do carro.
Caso similar aconteceu com o Tracker Turbo 2021 do servidor público André Kaschel, de São Paulo (SP). Sua esposa levava o filho do casal para a escola quando o freio começou a falhar.
“O carro estava em movimento, em via urbana. O freio ficou duro e o pedal começou a trepidar”, relembra.
Kaschel comprou o Tracker também usado, com menos de 48 mil km rodados, de um amigo que o havia adquirido 0 km e feito todas as revisões em concessionária. O problema ocorreu cerca de mil km depois da compra, mas a garantia já não cobria mais o veículo, pois havia sido adquirido com incentivos para PCD.
Por conta disso, a rede Chevrolet se recusou a custear o reparo, mesmo que a falha esteja ligada ao desgaste prematuro da correia, que estava dentro da garantia estendida de 240 mil km oferecida pela GM.
“Todas as revisões foram feitas na concessionária. No entanto, por se tratar de um carro PCD, a montadora informou que a garantia de fábrica é de apenas um ano e já havia expirado no momento do problema. O diagnóstico foi relacionado à falha no sistema de freios, mas o detalhe técnico [da correia] não foi especificado”, conta André.
O valor total do reparo foi de R$ 3.780,74.
O que leva a correia a se desgastar prematuramente
Já falamos da questão dos motores mantidos com óleo fora das especificações oficiais da fabricante. Mas e quando o lubrificante usado é o correto e a correia se desgasta prematuramente mesmo assim? Para Clayton Zabeu, do Instituto Mauá, a hipótese mais provável para isso é o chamado uso severo, que exige um período de revisões mais curto.
“Se a concessionária realizou as trocas de óleo e revisão com o óleo que o fabricante prescreve, pode ser que a correia tenha tido uma deterioração inesperada ou indevida e causado o entupimento do canal de alimentação de lubrificante da bomba de vácuo. Lembrando que o óleo deve ser trocado por quilometragem ou por tempo”, argumenta o especialista.
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Nelson Morales, da Dayco, complementa que veículos usados predominantemente na cidade, sempre em ciclos curtos – o motorista o utiliza por poucos minutos e logo o desliga, sem tempo suficiente para o lubrificante atingir a temperatura adequada –, com trânsito intenso e temperaturas elevadas, tendem a sofrer uma maior degradação do óleo e do material da correia.
“Pode parecer até contraintuitivo, mas um motor de um veículo que roda pouco e muitas vezes sofre mais do que um que roda mais quilômetros seguidos. Exemplo: se um veículo rodou menos de 10 mil km em 15 meses, pode ser que tenha sido muito mais usado no ciclo de ser ligado e desligado sem chegar à temperatura [ideal] de funcionamento. Isso gera muita contaminação no óleo por diluição de combustível, o que pode acelerar a deterioração do lubrificante”, finaliza Zabeu.
Como se prevenir
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Teoricamente, em casos do tipo, uma luz de aviso do sistema de óleo deve surgir no painel do veículo. Caso isso não aconteça, é preciso ficar atento a detalhes como endurecimento progressivo do pedal do freio, aumento do consumo de óleo ou ruídos anormais. Esses detalhes podem ajudar a identificar precocemente a falha.
O uso do óleo correto também é decisivo. “Caso haja incompatibilidade de substâncias, a degradação da correia pode acelerar seu desgaste, gerando resíduos que se desprendem e podem ocasionar o bloqueio do circuito de captação de óleo no cárter do motor”, alerta o especialista do Instituto Mauá.
“Além do tipo e qualidade do óleo, a troca periódica no intervalo recomendado pelo fabricante é essencial para evitar acúmulo de contaminantes e resíduos que causam bloqueios nos canais internos, comprometendo a lubrificação da correia e dos componentes auxiliares”, salienta Morales, da Dayco.
Nas revisões, peça que o mecânico observe a existência de resíduos de borracha no óleo, que denunciam a degradação da correia, ou até o entupimento da tela do pescador de óleo no cárter.
Correia banhada a óleo: o que é e por que exige mais atenção
As correias banhadas a óleo são uma alternativa às tradicionais correias dentadas secas ou correntes metálicas. Apesar de recentemente questionado, seu uso tem vantagens técnicas. “Há redução de atrito do motor, de ruído e de massa rotativa. Isso contribui para menor consumo de combustível e emissões mais baixas”, comenta Clayton Zabeu.
“A princípio, a durabilidade da correia banhada a óleo deveria ser maior, mas há que se cuidar de outros aspectos da manutenção”, enfatiza o engenheiro. Morales complementa que “a correia banhada a óleo traz benefícios importantes para a eficiência do motor, mas seu funcionamento depende de um equilíbrio delicado entre o material da correia, o óleo lubrificante e a manutenção correta. Qualquer falha nesse equilíbrio pode causar um efeito cascata, culminando em falhas mecânicas graves”.
E é justamente esse cuidado que nem sempre é seguido. O lubrificante usado precisa ser 100% compatível com o material da correia, e os intervalos de troca devem ser rigorosamente respeitados. Caso contrário, há riscos não só de falha da bomba de vácuo: “O motor pode sofrer uma falha grave por lubrificação deficiente ou pela ruptura da correia, ocasionando o famoso ‘atropelamento de válvulas’, alerta o coordenador da produto da Dayco.
O que diz a Chevrolet
Procurada por Autoesporte sobre as falhas de freio geradas pelo entupimento da bomba de vácuo, provocadas por resíduos de borracha da correia, a GM, proprietária da marca Chevrolet, não emitiu um comunicado oficial até a publicação desta reportagem.
Em novembro de 2024, a fabricante ampliou para até 240 mil km a garantia da correia sincronizadora dos motores CSS Prime. E, desde abril de 2025, oferece uma ação para renovar a garantia dos modelos Onix e Onix Plus, a partir da linha 2019/2020, comprados usados sem histórico de manutenção ou com a garantia violada por manutenção inadequada.
Segundo a montadora, o serviço está disponível em todas as concessionárias da rede Chevrolet e será válido até 31 de dezembro de 2025. Nesta ação, o consumidor terá seu carro inspecionado, além de receber uma troca de óleo e filtro de óleo pelo valor de R$ 660, valor bem próximo ao das primeiras revisões periódicas desses modelos – entre R$ 400 e R$ 700.
Caso seja identificado algum desgaste prematuro ou contaminação no sistema, a correia é substituída por R$ 700, já contemplando o preço da peça e da mão-de-obra, valor bem inferior a uma troca de correia fora da ação. Após todos esses procedimentos, a garantia também é restaurada até os 240 mil km originais.
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Questionada pela reportagem sobre o motivo de somente Onix e Onix Plus serem contemplados nesta ação, e não os modelos Tracker e Montana, equipados com motores da mesma família e com o mesmo sistema de correia banhada a óleo, a assessoria da Chevrolet disse que o SUV e a picape não apresentam número significativo de reclamações.
André Kaschel, proprietário do Tracker, segue indignado por ter que arcar com o conserto fora da garantia e o risco do defeito apresentado à sua família: “Essa situação colocou em risco real a vida da minha esposa e do meu filho, o que considero inaceitável em um veículo com histórico de manutenção em dia e baixa quilometragem”, aponta.
A GM também reforça a necessidade de seguir as recomendações de manutenção preventiva especificadas no manual do proprietário. O intervalo para revisão e troca de óleo e filtro é de 10 mil km ou 12 meses, o que acontecer antes.
Importante lembrar que carros com uso majoritariamente urbano, passando muito tempo em trânsito pesado ou em condições de uso severo, como estradas de terra e areia, devem ter as revisões realizadas em intervalo mais curto, a cada 5 mil km ou seis meses.
Para manutenção da garantia, o serviço deve ser realizado em concessionária autorizada Chevrolet. Entretanto, apesar de as condições de uso severo constarem no manual da Chevrolet, não há a especificação de um novo período de revisões.
No caso da Ford, por exemplo, a montadora recomenda reduzir o prazo de revisão de 10 mil km ou 12 meses para 5 mil km ou três meses.
Fonte: Autoesporte
Foto: Divulgação

