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A discussão que envolve a pavimentação do chamado “Trecho do Meio”, que representa mais de 400 quilômetros da BR-319, requer a participação de diversos setores da sociedade, principalmente dos povos tradicionais que vivem na área e que serão impactados diretamente pelas obras. Buscando a inserção dessa parcela da população nos debates, o Observatório BR-319 (OBR-319), com a coordenação da WCS Brasil, realizou nesta sexta-feira (15), o webinar “BR-319: Por que a participação popular importa?”.

Com o objetivo de evidenciar a importância e a necessidade do envolvimento de quem vive na região da rodovia nos assuntos relacionados à pavimentação e de encontrar mecanismos para solucionar os problemas existentes, o webinar abordou assuntos como as audiências públicas, consultas prévias, o licenciamento ambiental, o fortalecimento da governança como estratégia para reduzir os impactos das obras, entre outros.

A coordenadora do Centro de Direitos Humanos da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Tamara Brezighello Hojaij, apresentou dados sobre as audiências públicas realizadas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), no mês passado, para debater as obras da rodovia e que deveriam funcionar como espaços públicos para informar a comunidade sobre o empreendimento, com abertura para dúvidas, críticas e sugestões. Porém, segundo Tamara, o que se viu nas audiências não foi isso. De acordo com os dados apresentados, houve baixa participação popular nas audiências e, isso, aconteceu pela falta de informações sobre o projeto e a falta de transparência nos processos relacionados às obras.

“É necessário que as populações que serão impactadas (com as obras) tenham acesso aos estudos realizados na íntegra, com uma linguagem compreensível. Isso é fundamental não só para melhorar a qualidade dos próximos estudos, mas também para aprimorar a participação no âmbito das audiências públicas”, afirma.

Outro ponto chave no processo de licenciamento ambiental são as consultas prévias. Apresentando dados com base na legislação, o antropólogo Bruno Caporrino defendeu a realização de consultas em todos os momentos onde as comunidades tradicionais possam ser impactadas, respeitando suas formas de tomarem as decisões e seus critérios. Ele reafirmou a necessidade de ouvir os povos da região da BR-319 e definir estratégias que considerem a vivência de cada um, sua cultura e sua estruturação para o momento de tomada de decisões.

“Não há democracia sem pluralidade, portanto é necessário o respeito a quem tem diferentes culturas. A consulta pública é a consagração da nossa democracia e do direito à diversidade”, ressalta Bruno.

Bruno Caporrino enfatizou ainda a abertura de espaços para as comunidades tradicionais e a sua participação nos debates sobre a pavimentação da rodovia como fatores primordiais nas atividades relacionadas às obras da BR-319. “É perceptível a diferença da estrutura de comunicação nas comunidades onde há apoio de instituições. Esses povos e comunidades precisam se apropriar dos direitos que eles têm, do poder de tomada de decisão, de entenderem a respeito do que acontece em torno deles e as associações são fundamentais nesse processo”, enfatiza Bruno.

 

Exemplo da Bolívia

O fortalecimento da governança das populações foi o assunto abordado pela diretora da WCS Bolívia, Lilian Painter, que enfatizou os resultados do processo de estruturação realizado com o povo Tacana, da Amazônia boliviana. Segundo ela, as ações que empoderam os povos através de conhecimento dos seus direitos, organização, valorização dos produtos locais, conservação da área e incentivos de produção, é possível e gera resultados positivos.

Para Painter, é importante empoderar as populações que vivem na BR-319 para que os impactos do empreendimento na região sejam menores e para que eles possam se identificar no contexto em que estão inseridos.

“O fortalecimento da governança do povo indígena Tacana, na Bolívia, foi essencial para reduzir os impactos de um projeto de melhoria de uma rodovia ao longo do seu território indígena. O aspecto mais relevante é que dentro do território indígena se observam taxas de desmatamento muito menores quando comparadas às regiões fora desses territórios. Nosso estudo demonstrou que a gestão territorial indígena e o fortalecimento da governança desse povo é uma resposta efetiva para mitigar os impactos de uma rodovia e de seu projeto de melhoria”, comenta Lilian.

A diretora da WCS Bolívia destaca ainda que a gestão territorial, além de reduzir taxas de desmatamento, garante a conservação de bacias hidrográficas, de áreas úmidas e de reprodução para peixes migradores. Também mantém populações saudáveis de fauna silvestre e corredores ecológicos entre áreas protegidas.

“Também se observaram benefícios econômicos, pois a renda dos lares dos Tacana aumentou 100%, a conservação da floresta e da fauna gerou 44% dos ingressos dos lares dos Tacana, entre outros benefícios”.

    O vídeo completo do webinar está disponível no perfil da WCS Brasil no Facebook e no canal do OBR-319 no YouTube.

 

Observatório BR-319

O Observatório BR-319 é formado pelo Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Fundação Amazônia Sustentável (FAS), Fundação Vitória Amazônica (FVA), Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam), Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), WCS-Brasil e WWF-Brasil e Transparência Internacional Brasil. Para saber mais, acesse: www.observatoriobr319.org.br.