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Com três meses de
home office em razão da pandemia, o governo federal percebeu ser
possível manter os serviços públicos funcionando e ainda economizar no
pós-coronavírus
 As discussões sobre a construção de um novo
normal, em que as videoconferências prometem substituir boa parte das reuniões
e viagens de trabalho, não estão em curso apenas na iniciativa privada. A
administração pública federal também está atenta a essa possibilidade. Afinal,
após mais de três meses de pandemia e home office, o governo percebeu que é
possível manter os serviços públicos e a gestão da máquina pública com
atividades parcialmente remotas e ainda economizar com isso. Por isso, estuda
como manter parte dessa economia e já diz que o corte de gastos pode chegar a
R$ 500 milhões por ano no pós-coronavírus.
 Balanço da Secretaria de Gestão do Ministério
da Economia, ao qual o Correio teve acesso, explica que o governo
federal economizou quase R$ 200 milhões só com deslocamentos e viagens a
serviço nos últimos três meses. Esse gasto foi de R$ 265,2 milhões, entre março
e maio de 2019, mas somou apenas R$ 65,5 milhões no mesmo período deste ano
devido à necessidade de isolamento social e às restrições a viagens aéreas
impostas pelo novo coronavírus. A redução foi de 75%. Por isso, por mais que
saiba que as viagens vão voltar a ocorrer nos próximos meses, o governo quer
manter parte dessa economia. “A pandemia mostrou que muitas agendas que
demandavam viagens de servidores podem ser substituídas por reuniões virtuais.
Já existe tecnologia para isso”, avalia o secretário de Gestão do Ministério da
Economia, Cristiano Heckert.
 Ele calcula que, mesmo mantendo as viagens
essenciais, o governo pode reduzir de R$ 400 milhões a R$ 500 milhões os gastos
anuais relacionados a viagens. Afinal, não é só a compra de passagens que
diminui. Levantamento da Associação Contas Abertas revela que, além de reduzir
custos com bilhetes aéreos, esses últimos três meses de isolamento social
diminuíram em R$ 160,1 milhões os gastos da União com diárias; e em mais R$ 5,2
milhões as despesas com hospedagens.
 Segundo o secretário, o governo está
calculando quais são os outros gastos de custeio que também podem ser cortados
com a nova lógica de trabalho apresentada pela pandemia. Mas o levantamento da
Contas Abertas dá uma ideia de onde pode vir boa parte dessa economia, caso o governo
reduza a frequência das viagens a serviço e também amplie o uso do trabalho
remoto no pós-pandemia — possibilidade que, de acordo com Heckert, de fato está
na mesa do Executivo.
 A Associação Contas Abertas constatou um corte
de R$ 40,4 milhões nos gastos do Executivo, do Judiciário e do Legislativo com
mobiliário, além de uma diminuição de R$ 13,9 milhões com locação de imóveis;
R$ 8,5 milhões, com material de consumo; e R$ 8,3 milhões, com material de
expediente, entre março e maio deste ano. Também foram observadas reduções
significativas nos pagamentos de auxílio-transporte (redução de R$ 34,1
milhões) e adicional de periculosidade (menos R$ 22 milhões).
 Balanço da Secretaria de Gestão e Desempenho
de Pessoal do Ministério da Economia aponta que 79.641 servidores públicos
federais civis seguiam trabalhando de casa no fim de junho, o que equivale a,
aproximadamente, 49% da força de trabalho da administração pública
federal. 


 Ampliação

 Fundador e secretário-geral da Associação
Contas Abertas, Gil Castello Branco diz que essas cifras ainda podem crescer
bastante caso o trabalho remoto seja regulado pelo governo no pós-pandemia. E
acrescenta que, a longo prazo, essa nova dinâmica laboral ainda pode reduzir
outros itens significativos do gasto público, como o aluguel de imóveis e a
contratação de serviços terceirizados e de manutenção predial. “Os ministérios
estão funcionando com metade do efetivo de forma presencial. Então, é possível
ampliar o teletrabalho no pós-pandemia para reduzir despesas. Isso pode abrir
mais espaço na Esplanada e, assim, reduzir os custos de aluguel, IPTU,
condomínio, energia, vigilância, limpeza. Contratos terceirizados poderão ser
revistos, abrangendo gastos com garçons, recepcionistas, aluguéis de máquinas
para cópias de documentos. E despesas com vale-transporte e transporte de
servidores também podem ser reavaliadas”, avalia Castello Branco.
 Cristiano
Heckert admite as alternativas e revela que, por conta disso, a regulamentação
do teletrabalho está em estudo no governo. “A pandemia deixou a lição de que o
trabalho a distância pode gerar uma economicidade para a administração pública
sem prejudicar o atendimento ao cidadão. Então, acelerou um processo que já
vinha avançando em alguns órgãos públicos nos últimos anos em relação ao
teletrabalho”, declara. 


 Servidores pedem contrapartida 

 Os servidores estão dispostos a discutir a
regulamentação do home office no pós-pandemia já nesta semana, em reunião
marcada com a Secretaria de Gestão e Desempenho Pessoal. Presidente do Fórum
Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques
explica que, além de reduzir os gastos públicos, o teletrabalho pode trazer
benefícios para o funcionalismo e para a população.
 “Em alguns casos, o servidor gasta duas horas
a menos com o deslocamento para o trabalho. Isso traz qualidade de vida e ainda
contribui para a redução do tráfego urbano e da questão ambiental nos grandes
centros urbanos”, ressalta Marques. Ele garante que isso não reduz a qualidade
do serviço prestado à população. Ao contrário. Ao adotarem o home office,
órgãos como a Controladoria Geral da União e a Advocacia Geral da União
cobraram até um aumento de eficiência relativo a esse tempo de deslocamento
como contrapartida dos servidores. Estudos de avaliação do desempenho dos
servidores no trabalho remoto estão sendo realizados pelo governo nesse período
de pandemia.


 Cautela

 Os servidores, porém, pedem contrapartidas do
governo para que essa nova forma de trabalho continue sendo produtiva para
todos. Querem, por exemplo, a garantia de que os servidores terão os
equipamentos e a internet necessários para tocar suas atividades de forma
remota. E que poderiam, em alguns casos, equilibrar a redução de gastos com
viagens nos últimos meses com o auxílio-transporte e o adicional de
periculosidade.
 “O trabalho remoto está dando resultados. Mas
isso precisa ser analisado com cautela. Hoje, os servidores estão usando os
seus equipamentos e a sua internet. Mas, a longo prazo, deveriam receber as
condições adequadas de trabalho”, frisa o secretário-geral da Confederação dos
Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), Sérgio Silva. “O governo
não pode repassar toda essa redução de custos para o servidor”, reforça
Marques. O presidente do Fonacate também pede que haja uma avaliação criteriosa
na definição de quais viagens a serviço devem ser cortadas, para evitar que
atividades de fiscalização e controle não deixem de ser feitas com a
periodicidade adequada por conta disso. 
Foto: Divulgação