Então, de acordo com a cronologia das evidencias históricas, o Boi Caprichoso fundado o sexto bumbá na História do fenômeno boi bumbá em Parintins. É sabido entre os seguidores do FOCO AMAZÔNICO que a sua fundação procede daquele “panavueiro de porrada” por ocasião daquela apresentação de briga de touro entre o Boi Galante e o Boi Garantido, ao redor da fogueira fronte a residência do eclético Malagueta. Mais perdidos do que plebeu em festa de bacana, Emidio Vieira e Thomás Velásquez responsabilizaram os irmãos então adolescentes: Pedro Cid, Nascimento Cid e Artur Cid pelo acontecido. Acusaram-nos de traidores e se não fosse o bastante lhes caçaram o direito de brincar o Boi Galante e, assim, viraram as costas para eles.
Finda a temporada junina naquele ano de 1926 aconteceu o festejo de matança do Boi Galante. Naquelas alturas se Thomas Velásquez o havia abandonado, Emídio Vieira (o tracajá) lutava por ele. Mas em razão do acontecido pairava um clima de ódio da parte dele em relação aos irmãos Cid. Clima de ódio, todavia, que parecia não ofuscar o brilho da festança oferecida ao povo do bairro da Francesa, que dançava e se deliciava com a abundância em iguarias típicas do tempo junino.
Segundo relatos orais Emídio Vieira era abstêmio, mas naquela noite resolveu beber. Para tomar coragem, certamente, fato foi que por força da “mardita”, como diria o poeta paraense ficou violento e saiu expulsando o povo para fora a pontapés e baforadas de cachaça. Passando por onde estavam os irmãos Cid xingou-lhes a mãe, o pai e respectivos antepassados, passou-lhes a pernada e os fez correr porta afora. Os irmãos Cid, revoltados, reuniram seus companheiros, deixaram aquele recinto e seguiram rumo a casa de dona Lindóca, uma quadra abaixo. Ali, na decisão de punir Emidio Vieira, agora desafeto seus, idealizaram a fundação de outro Boi bumbá no bairro da Francesa.
Consta que depois daquela reunião houve outras para discutir a decisão tomada entre aquela rapaziada. Mas a reunião de fundação aconteceu na residência de dona Antônia, mãe dos líderes fundadores, na travessa Sá Peixoto, Bairro da Francesa. Entre escritos e relatos orais os historiadores comprometidos com o Boi bumbá Caprichoso contam de uma forma enquanto que os historiadores comprometidos com o Boi bumbá Garantido contam de outra forma. Não havendo consenso, daí a afirmativa de que a história do fenômeno Boi bumbá em Parintins vem sendo contada conforme os referidos bumbás. Quanto às versões, vejamos:
Primeira versão: Afirma que Emídio Vieira teria aprendido a brincar o boi bumbá com o Coronel José Furtado Belém, homem importante em Parintins e no Amazonas, tanto que fora deputado provincial, […] e enquanto advogado do Estado do Amazonas bateu-se em duelo nos tribunais com os advogados do Interventor federal Magalhães Barata quando, esse, à força tentou expandir as fronteiras do Estado do Pará para dentro do Estado do Amazonas. Uma vez experimentado, anos depois, Emídio Vieira teria convidara Tomas Velásquez e, juntos, fundaram o Boi Galante. Três anos depois, não havendo mais interesse de Emídio Vieira e Tomás Velásquez, o Galante foi entregue para Artur Cid que lhe mudou o nome para Boi Caprichoso.
Segunda versão: Afirma que naquela festa de matança do Boi Galante, em julho de 1926, em razão da bebedeira de Emídio Vieira, na mesma noite os irmãos Cid teriam abandonado o referido bumbá e fundaram o Boi bumbá Caprichoso.
Terceira versão: Afirmam entre os brincantes do Garantido: “O Boi Caprichoso é resultado de um golpe sujo deflagrado pelos irmãos Cid contra Emídio Vieira, o Tracajá. Primeiro, articularam bonito e lhe tomaram o poder de mando no Boi Galante; segundo, extinguiram o referido bumbá e fundaram, em seu lugar, o Boi Caprichoso”.
Quarta versão: Afirmam os mais antigos brincantes do Boi bumbá Garantido que os irmãos Cid sabiam que Emídio Vieira era abstêmio, mas naquela noite, com jeitinho não apenas o convenceram a beber, mas o fizeram embriagado. Provocaram-no e, assim, bêbado, ele teria feito aquele panavueiro todo. Então, quando desmoralizado perante o povo do Bairro da Francesa lhe tomaram o Boi. E concluem: “Eles tomaram na marra, foi roubo, mesmo, eles roubaram o Boi Galante do Velho Tracajá…”
Quinta versão. De acordo com Tomás Cid, filho de Pedro Cid, um dos fundadores do Boi Caprichoso, na reunião para a sua fundação que aconteceu em outubro de 1926 se encontrava Antônio Arigó, cidadão nordestino residente em Manaus que todos os anos, no mês de junho, descia até Parintins para brincar o fenômeno boi bumbá e foi dele a sugestão do nome para o novo bumbá.
Em meio a discussão e acrescente-se acirrada ele teria dito: “Então, amigos, se já existe um Boi Garantido, aqui, em Parintins, porque não fundar um Boi Caprichoso?” e prosseguiu dizendo que os nomes de boi bumbá, “Garantido ou Caprichoso, existiam desde o Nordeste pós Amazônia Colonial; Garantido, como forma de pagamento de promessa a São João; Caprichoso, boi descompromissado com qualquer santo”. Sugestão aceita, estava então fundado o Boi bumbá Caprichoso.
Subentende-se no discurso de Antônio Arigó que os nomes, Boi Garantido e Boi Caprichoso, há muito que existiam na história da cultura do boi enquanto fenômeno ou forma de expressão. É provável que procedam da Península ibérica, de Portugal, mais precisamente porque na Fazenda Itaúna, que pertenceu a João Ferreira Novo, saudoso patriarca português, em Parintins, dentre os seus touros reprodutores de raça um deles se chamava justamente “Garantido”.
Tão querido era aquele touro que, depois que morreu, a carcaça da sua cabeça ornamentava o portão de entrada da Fazenda Itaúna. Segundo consta, quando Lindolfo Monteverde articulava a fundação do Boi bumbá Garantido, a sugestão para o nome do referido bumbá viera da histórica Fazenda Itaúna, em Parintintins, mais precisamente do ilustre patriarca português, João Ferreira Novo. Segundo o saudoso Rui Mendes, a sugestão viera, através do também saudoso Valdir Viana.
Significa dizer que Antônio Arigó e o sr. João Ferreira Novo tinham conhecimento de que os nomes Garantido e Caprichoso, na cultura do boi enquanto forma de expressão ou de manifestação festiva vieram do outo lado do oceano. Vieram entre os elementos ibéricos e que entrelaçados aos elementos sul-americanos foram utilizados na construção da cultura projetada para as Américas Portuguesas.
Retornando à reunião de fundação do Boi Caprichoso, fato foi que discutida a escolha dos diretamente responsáveis, Pedro Cid, aos 16 anos de idade, foi proclamado chefe e seu irmão, Artur Cid, também conhecido como Feliz Cid e Feliz do Roque, aos 14 anos de idade, foi proclamado amo do boi. Feito assim, em junho do ano seguinte, 1927, o Boi bumbá Caprichoso se apresentava pela primeira vez em Parintins. Esta quinta versão conduz ao entendimento de que o Boi bumbá Caprichoso surgiu enquanto boi mirim. Fato é que entre os notáveis, eis os seus brincantes fundadores:
Pedro Cid;
Nascimento Cid;
Artur Cid;
Luís Gonzaga;
Gito da Maninha;
Antônio bobó (boboí);
Mundinho da Carolina;
Rapaziada do bairro da Francesa.
Convidados especiais:
Lindolfo Monteverde (que levou companheiros);
Antônio Arigó (que desceu de Manaus);
Emídio Souza (e companheiros do Aninga);
Manoel Leocádio (e companheiros do Aninga).
Fonte: TENÓRIO, Basílio, 2016, p. 87/88.
Por Basílio Tenório


