TCE
 O plano do Flamengo de assumir a transmissão
dos jogos do time no Campeonato Carioca em vez de vender os direitos aparenta
ser original. Só que não. Parece reciclagem de uma sementinha plantada há três
anos pela Confederação Brasileira de Futebol. Em 2017, o relacionamento entre a
CBF e o Grupo Globo ficou estremecido devido a uma tentativa da entidade de
seguir carreira solo. Comandada à época por Marco Polo Del Nero, a entidade não
comercializou as exibições dos amistosos contra Argentina e Austrália, ambos
realizados na Oceania. Comprou horário na TV Brasil, TV Cultura e também levou
a partida ao ar no canal CBF TV, na conta da entidade no Facebook e num
aplicativo da Vivo, um dos nove patrocinadores oficiais da Seleção.
 A queda de braço começou quando a CBF decidiu
realizar o jogo beneficente da amizade entre Brasil e Colômbia, no Estádio Nilton
Santos, Rio, em homenagem às vítimas do acidente aéreo da Chapecoense. A
partida não estava prevista no contrato com a Globo e o SporTV. A CBF ofereceu
o jogo avulso por R$ 2 milhões para o velho parceiro, que recusou-se a pagar.
Em retaliação, a CBF contratou uma produtora, transmitiu à época no Facebook
Live e distribuiu o sinal para canais abertos como TV Cultura, Globo, RedeTV,
Esporte Interativo, Rede Vida, Bandeirantes, TV Brasil e RIT TV; e os fechados
SporTV, ESPN Brasil, FOX Sports, EI Maxx e BandSports.
 Empolgada com o resultado, a CBF decidiu
realizar dois testes no meio do ano em amistosos da Seleção contra a Argentina
e a Austrália, ambos na Oceania. Sem acordo com o Grupo Globo, a entidade
arriscou assumir o protagonismo da transmissão projetando autonomia na venda de
patrocínio para os jogos e facilidade na comercialização dos direitos
internacionais dos amistosos.
 “A CBF tinha planos de negociar os direitos
dos amistosos e das Eliminatórias da Copa 2022 na forma de bid (leilão
fechado). Recentemente, decidiu vender os dois jogos amistosos de junho de
forma avulsa e, embora não acreditemos que esta seja a melhor solução para
todas as partes, tentamos negociar mas não chegamos num acordo”, explicou a
Globo à época.
 Na época, a cúpula da CBF percebeu que também
podia contar com o know-how no mercado para realizar transmissões desse porte.
Passou a estudar uma parceria com a Vivo para transmissão de jogos no celular a
fim de mergulhar no universo das redes sociais. Antes, precisava fazer um laboratório,
e investiu pesado. Apostou nas contratações pontuais do locutor Nivaldo Prieto
e dos comentaristas Edson Arantes do Nascimento, o Rei Pelé, e de Denílson. A
derrota por 1 x 0 para a Argentina no Facebook Live teve 2,4 milhões de
visualizações.
 Qualquer semelhança com a queda de braço entre
Flamengo e Globo é mera coincidência. Assim com a cúpula rubro-negra, os
dirigentes da CBF consideravam que poderiam arrecadar mais ao vender os
produtos diretamente aos anunciantes em diferentes plataformas. Meses depois,
comercializou os direitos de transmissão dos jogos da Seleção com a Globo até
2022 – e lucrou com isso. A emissora pagou 25% a mais pelo acordo em relação ao
contrato anterior. A CBF recebe cerca de US$ 2,5 milhões por jogo da Seleção
até a Copa do Qatar. A empresa tem exclusividade nas tevês abertas, fechadas e
na internet.
 Por enquanto, o Flamengo resiste, mas age de
forma parecida com a CBF. Está na fase de laboratório.  Sem acordo com a
tevê no Campeonato Carioca, transmitiu a partida contra o Bangu na Fla TV após
batalha no tapetão e reforço presidente com a MP 984/2020 assinada por Jair
Bolsonaro. Neste domingo, anuncia a transmissão da semifinal da Taça Rio contra
o Volta Redonda na plataforma MyCujoo e cobrará R$ 10 de quem não aderiu ao programa
de sócio torcedor do clube – medida considerada impopular pelos torcedores do
clube e a crítica especializada desde que foi oficializada na sexta-feira.
Foto: Lucas Figueiredo (CBF).