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Depois da segunda gestação, Cláudia Cattani, 39, engordou e não conseguia emagrecer. Com 130 kg e deprimida, ela  procurou o plano de saúde para uma cirurgia bariátrica, mas o processo demorou tanto que ela decidiu começar a mudar os hábitos sozinha. A seguir, ela conta como venceu a obesidade:
Desde pequena. Fui uma criança gordinha, e na adolescência, fiz dietas malucas para conseguir eliminar alguns quilos. Quando engravidei pela primeira vez, aos 19 anos, não consegui manter as restrições e engordei 40 kg. Depois que meu filho nasceu, passei três anos tentando emagrecer e consegui perder 20 kg com a ajuda de um medicamento controlado.
O remédio tirava a fome, tinha dias que até esquecia de comer. Comecei a passar mal e quando fui ao médico, descobri que minha pressão estava descontrolada e que estava grávida. Mesmo suspendendo o remédio, não ganhei muito mais peso. Tinha muito enjoo e não comia tanto. Foi no intervalo de sete anos entre a segunda e terceira gestação que eu realmente perdi o controle. Bebia até dois litros de refrigerante em um dia, não saía para comprar roupas novas pelo constrangimento de não achar nada do meu tamanho e só vestia vestidos enormes que minha mãe trazia para mim.
Fiquei sete anos sem me pesar. Quando eu engravidei pela terceira vez, durante o exame pré-natal, a médica perguntou meu peso e eu disse que deveria estar com cerca de 97 kg. Ela respondeu que eu estava pesando 118 kg. Foi uma gestação de risco, tive suporte psicológico e apoio nutricional porque eu só poderia engordar 7 kg. Acabei ganhando 12 kg, chegando ao ápice: 130 kg (tenho 1,65 m de altura).
Um mês após o nascimento da minha filha, voltei na médica e não tinha emagrecido nada. Ela deu bronca, disse que eu precisava cuidar da minha saúde. Eu, que já sofria com depressão, fiquei em um estado muito deplorável, cheguei a pensar em suicídio. Não queria sair de casa pois ouvia comentários maldosos de parentes e conhecidos. Passei a notar que estava magoando a minha família, já que eles deixavam de fazer várias coisas por mim. 
Qualquer evento que tivesse cadeiras de plástico, por exemplo, não podíamos participar. Certo dia, fui ao mercado com a minha bebê e uma conhecida perguntou de quem era a criança. Eu respondi que era minha e ela questionou se era adotada. Quando eu disk que não, ela ficou surpresa e afirmou não ter reparado minha gravidez, por causa do meu tamanho.
Voltei para casa arrasada e comecei a me informar sobre a cirurgia bariátrica. Passei com alguns dos profissionais que o processo requeria, entre eles, uma endocrinologista. Ela me humilhou fazendo cara de nojo para o meu corpo, disse que meu peso significava que era relaxada e não me importava com a minha saúde ou aparência. 
Entrei na fila do plano de saúde, mas a lista era gigante. No dia que tive acesso à psicóloga pela primeira vez, percebi que fazia um ano desde o início do pedido do procedimento e eu não tinha perdido um quilo sequer. Pensei que se tivesse feito algo por mim mesma, talvez eu tivesse mudado um pouco.
Pouco depois, aconteceu algo que funcionou como o empurrão que eu precisava. Deitei para fazer minha filha dormir e coloquei meu celular entre nós. Não sei como, mas ele se encaixou na minha barriga. Levantei para procurar, não achava de jeito nenhum. Meus filhos sugeriram ligar. Quando a luz azul piscou nas minhas dobras, eles gritaram: ‘Mãe, olha onde está!’. Eles riram e eu também, mas foi uma situação constrangedora. 
Depois disso, falei para mim mesma ‘Acabou a palhaçada, não dá mais para esperar’. 
Não dormi a noite toda. De manhã, contei para o meu marido e ele sugeriu que fizéssemos uma caminhada. Tomei coragem por estar com ele, calcei meu único tênis —um calçado réplica de marca,  já velho — e fui. Eu me senti melhor depois de completar o exercício. No dia seguinte, estava com dores no corpo todo, mas fui de novo. E assim fui criando uma rotina.
Quando cogitei fazer a bariátrica, uma nutricionista elaborou um cardápio que larguei na gaveta. Passei a segui-lo e venci a vergonha de me inscrever na academia. Eu era a pessoa mais obesa que malhava lá, mas se alguém me olhou feio ou fez comentários, não vi. Estava muito focada. 
Fiz uma nova consulta com a nutricionista e em um mês já perdi 10 kg. Demorou algum tempo para entender que isso não me dava o direito de comer qualquer guloseima, mas com ajuda psicológica, consegui o equilíbrio e trabalhei minha autoestima.
Em 2018, perdi meu filho de 14 anos. Foi um baque, vi a depressão voltar, mas consegui me reerguer, sempre pensando no orgulho que ele tinha da minha história. 
Após anos de luta, perdi 65 kg e já mantenho o peso há quatro anos. Continuo com os treinos na academia e caminhadas. Minha coluna e joelho são limitados por causa da obesidade, mas consigo adaptar. 

Durante o processo, eu me apaixonei pelo poder que os alimentos têm na vida das pessoas e comecei a estudar nutrição. Estou no sexto semestre e quero ajudar pessoas que passam pelo mesmo que passei. São poucos os profissionais que conhecem por experiência própria os desafios da obesidade.